Hoje visitei uma galeria de arte e caminhei lentamente pelo espaço. Eu via pessoas, eu via quadros, eu via
tudo, menos eu mesma. Foi um momento tão confuso porque eu queria ver as
obras, porém os quadros ficaram em segundo plano.
Me
senti estranha no meio daquelas pessoas, umas sorridentes, outras
tagarelas e outras mal se ouvia a voz, elas apenas observavam
atentamente a arte exposta. Algumas gesticulando e com seus celulares
registrando a exposição que eu estava e não estava ao mesmo tempo. Eu
não era humana, era apenas um objeto como outro qualquer. Eu
simplesmente era como uma quadro naquela parede, estático e sendo
analisado por quem passava por mim. Talvez fosse fotografada ao lado de
outra peça de enorme valor sem perceber por um descuido de alguém
afoito pelo click.
Certamente
eu seria uma ótima modelo, caso algum pintor quisesse usar seus pincéis
e tintas para eternizar os olhos fundos, cheio de olheiras e as roupas
do dia a dia, mais práticas para combinar e serem jogadas na máquina de
lavar. Ninguém me qualificou nesse sentido e não recebi nenhum convite,
eu não era nenhuma Mona Lisa, apesar do meu olhar enigmático e um pouco
perturbador. De repente o problema não era eu e sim a ausência de
Leonardo da Vinci, ou quem sabe já estava pronta e só faltava a moldura e
alguém disposto a me pendurar na parede com os demais. Acho que faltou
boa vontade e me deixaram no chão, no canto esquerdo daquela imensa sala.
No
canto esquerdo havia também uma enorme mesa de designer moderno, a
tampa era de vidro e não tinha os pés comuns, parecia que flutuava sobre
um oito, na verdade era um infinito esculpido nas cores branca e preta
que brilhavam e qualquer míope conseguia enxergar. Creio que não me
colocaram ali por acaso, estava tão cansada de tudo, de mim que acabei
estagnando. A mesa virou meu divã.
As
curvas, as cores, o vidro e o brilho me fizeram pensar em mim. Com o
passar do tempo a minha maturidade foi me enclausurando. Me acostumei
sempre com o mesmo caminho, o reto parecia ser mais seguro, eu só
escolhia as cores mais fáceis de combinar, e eram sempre as mesmas. Eu
não me permitia seguir um outro trajeto, fazer um desvio. Eu não me
permitia colorir meu mundo com cores diferentes, a paleta era única pois
eu julgava que a praticidade era a regra sempre, talvez nem seria regra
e sim o comodismo de arrumar meu guarda-roupa constantemente da mesma
forma.
Eu
tinha medo de me cortar e não ser capaz de juntar os cacos, perder
algum pedaço e ficar incompleta. Eu tinha medo do brilho ofuscar meus
olhos e não ter um óculos Dior, tão lindo e caro.
Na
verdade, esse medo todo era falta de ousadia. Sair da minha zona de
conforto, do habitual e que não me satisfazia mais e eu não compreendia que era isso que tanto me incomodava.
Não
existe vida sem rotina, entretanto é possível mudar sua rotina de vez
em quando. Ser escravo dela não é saudável e isso me matava aos poucos. Eu era uma pessoa imóvel no leito da UTI sem perceber, vendo a vida
passar lá fora pelo vidro da sala. Com receio da queda, da incerteza,
do novo.
Ah
saudades da minha ousadia, quando eu balançava sem medo de cair. Quando
eu ralava meus joelhos, chorava, e depois continuava a brincar como se a
dor fosse tão pequena diante do que eu tinha pela frente. Alguns
tropeços, empurrões, puxadas de cadeira, rasteiras da vida.
Sentia
falta de quando eu era criança porque eu ousava, eu não tinha medo do
desconhecido, do perigo. Isso tudo pensei olhando uma mesa sofisticada e
eu tão simples, perdida dentro de uma galeria, dentro de mim mesma.
Saí
da galeria, os quadros ficaram para trás, e deixei aquela mulher no
mesmo canto esquerdo em que ela própria se colocou e erroneamente
culpava as outras pessoas. Só levei a vontade de ousar, estilhaçar
quando for preciso, ser mais flexível, ter outras tonalidades e não se
esconder da luz mesmo quando for necessário ter um óculos e ele não ser
importado.
Muitas
vezes é preciso sair do confinamento que nós mesmos nos colocamos, se
aventurar mais. Hoje foi a primeira vez que fiz um programa sozinha, eu
achava esquisito sair sozinha para esses lugares sem nenhuma companhia.
Não sei nem de quem eram os quadros, nunca me interessei por pinturas.
Eu nunca tinha visto uma exposição de quadros mas a galeria era próxima
ao restaurante e como eu estava na hora do almoço e sem fome, eu resolvi
entrar.
Algumas
portas precisam ser abertas mesmo que você entre e saia de lá sozinha,
com alguém ou deixe para trás o que precisa ser mudado. Talvez eu volte
novamente e aprecie as obras do artista, ou quem sabe eu sente sobre
aquela mesa linda, vestida com meu tubinho preto, usando meu batom vermelho e cruze
as pernas com meu salto agulha. Não precisa ser uma cruzada de pernas como a de Sharon Stone, mas será a minha cruzada de pernas, aquela sem medo de ousar e nem um pouco preocupada com os olhares reprovadores.
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Este post faz parte da Blogagem Coletiva Relâmpago do Grupo Café com Blog. |
👀Blogs participantes:
Retipatia 💗 Jardim Literário 💗 Metamorphya 💗 Profano Feminino 💗 Dose de Poesia 💗 Jubirubs
Menina! Adorei como você usou as palavras e a imagem da proposta da blogagem. Texto tão gosto de ler, um modo diferente de ver as coisas e, quem nunca passou por momentos assim em que precisamos perder o medo de nós mesmos e nos redescobrirmos de algum modo não é? Dá vontade de repensar tantas coisas que às vezes perdemos por não sair da 'zona de conforto'. Amei! Beijos beijos!
ResponderExcluirMetamorphya•••
Obrigada Bruna! Eu amei a imagem, me veio a cabeça tantas possibilidades. Até que me decidi por esse caminho.Sim, realmente dá vontade de pensar e repensar muitas coisas. bjs
ExcluirQuando nós prendemos na nossa zona de conforto abrimos mão de muitas coisas, e entre elas acabamos abrindo mão de quem somos, nos deixando de lado para sermos esquecidos aos poucos. Temos que ter ousadia para aceitar quem somos e arriscar naquilo que acreditamos que nos traga felicidade.
ResponderExcluirGostei da maneira que você desenvolveu o tema!
Blog Profano Feminino
Esse tema foi maravilhoso, vi que cada uma seguiu um caminho, histórias diferentes. Eu amei, também penso como você.
ExcluirObrigada!
Olá, tudo bem? Adorei o seu texto, ficou ótimo! Acho bacana essas blogagens coletivas, que nos inspiram a fazer um post.
ResponderExcluirBeijos,
Duas Livreiras / Sorteio de 5 KITS
Obrigada Larissa. São ótimas mesmo, adoro essas blogagens. bjs
ExcluirEu amei seu texto! Super sincero e senti a verdade em cada palavra e foi muito bem escrito. O modo como você juntou as palavras do desafio e junto em um texto cheio de críticas tão bem relacionadas a vida que estamos acostumados a levar. Querer mais de nós mesmos é nossa obrigação! Querer ser melhor, se sentir bem, viver o lado ousado e descontraído de nós mesmos! Adorei mesmo!
ResponderExcluirxoxo
Rê
Obrigada Rê! Me sinto lisonjeada com suas palavras. Eu fiquei muito feliz com esse texto, acho que consegui passar exatamente o que eu queria. bj
ExcluirQueria muito ter feito essa blogagem,mas perdi o prazo.Adorei suas palavras, parabéns pela criatividade.bjus
ResponderExcluirObrigada Vivian.bjs
ExcluirNovamente um texto super gostoso de ler. Você arrasa muito. Gostei e a gente sente cada palavra e cada sentimento.
ResponderExcluirBeijos
#ascariocasby
Obrigada Lu! bjs
ExcluirAee parabéns pelo texto!!! Excelente!!! Conheci esse desafio a pouco e achei legal demais!!!
ResponderExcluirBarbara
Obrigada! bjs
ExcluirDiversas vezes eu já me questionei. Quem eu sou? Um tempo depois de entrar na faculdade, eu passei por uma re-construção de mim. E é realmente isso! Esse medo, essa falta de ousadia... A gente acaba entrando na rotina e deixando a vida no piloto automático. Precisamos tomar as rédeas! Buscar em nosso interior coisas que nos façam felizes! Amei seu texto e os questionamentos que trouxe à tona. <3
ResponderExcluirObrigada Nathália! Isso acontece e muito, também passei por isso. Só que chega uma hora que precisamos mudar essa rotina né. bjs
ExcluirAmei o seu texto, como sempre né?! Senti sinceridade em cada palavra, você usou elas muito bem! Querer o nosso melhor a cada dia! Inspirador! Bjuus!
ResponderExcluirObrigada Ju! bjs
ExcluirGostei bastante,muitas vezes a sair da zona de conforto é o caminho e a ousadia faz a diferença para voltarmos a nos reconhecermos :)
ResponderExcluirBeijos ^.^
Verdade! Obrigada! bjs
ExcluirHoje eu ainda me pergunto quem eu sou? o que estou fazendo da vida? qual é o meu proposito? Mas eu procuro de vezes em quando ousar um pouco, como quando ano passado colori meu cabelo de roxo. Esse sempre foi meu sonho e eu não permiti que o medo do que as pessoas iam pensar me impedissem de algo algo que queria tanto. Precisamos ser mais assim na vida
ResponderExcluirhttps://deixacombinado.wordpress.com/
Isso acontece e muito Nani, eu também passei por isso, mas se a gente não der o primeiro passo continua a mesma coisa não é. bjs
Excluir"Algumas portas precisam ser abertas mesmo que você entre e saia de lá sozinha" é a mais pura verdade. É preciso ousar, é preciso arriscar, caso contrário nada é feito!
ResponderExcluirBem assim mesmo. bjs
Excluirpreciso levar teu texto pra vida! odeio fazer as coisas sozinha. nunca fui ao cinema sozinha acredita? perdi de ver muuuitos filmes no telão por essa bobagem!
ResponderExcluirquem sabe um dia ahuhauhauah
como diz a musica "vamos nos permitir" não é mesmo?!
beijos
Eu também tinha essa dificuldade, aos poucos estou vencendo isso. Já fui pior.rsrs
Excluirbjs