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Tempos difíceis e a gente corre
atrás de um bico pra dá aquela volta na crise. Poxa entrar um a mais sempre é
bom, então resolvi fazer um bico de garçom. Estou aqui me virando nos 30, sou
eu Rafael, mas pode me chamar de Rafa, desço a ladeira pra estudar lá
na esquina, e também ajudava meu tio no camelódromo, mas cansei de perder mercadoria
pros homi.






Então descolo um extra no fim de
semana, dou uma parte pra minha mãe pra ajudar nas despesas de casa porque meu
pai já ganha uma miséria de aposentadoria, então se eu não sou aviãozinho é
assim que é a vida aqui na comunidade. Ganho a vida na honestidade como meus
pais sempre me ensinaram. Aqui só entra em furada quem quer, o bagulho é sério
e a parada é loca.









Aliás comunidade, uma ova, aqui é
a favela mesmo. Essa coisa de comunidade inventaram de uns tempos pra cá, não
sei o porquê já que na hora de me apontar na rua, ninguém fala o lá da
comunidade, o povo grita logo: o favelado.









Então é assim que tem sido a
minha vida,  fim de semana presto serviço
pra um buffet lá da zona sul, um mano meu me indicou e só estou pegando festa
de rico, aqueles condomínios da Barra, caramba o povo pra fazer festa. E as
figurinhas se repetem, vira e mexe vejo umas caras parecidas nessas festas.









E foi numa dessas que encontrei
Alice, ai que loirinha, só soube do nome quando a turma dela falou. Alice toda
burguesinha trabalhada na riqueza e beleza. Confesso que ia mais na mesa dela
do que nas outras, e percebia que ela também me olhava, mas chegar numa mina
assim e trabalhando não dava.Também a garota vivia em outro
mundo, só andava de salto, naquele carrão e não ia me dar bola né, logo eu um
pretinho da favela. Aqueles caras babando ela, e ela toda sissi e
eu cá só na admiração da beldade.









Um dia fui trabalhar de garçom, mas
em um clube como folguista e lá estava ela, Alice desfilando na borda da
piscina, agora eu ficava atrás do balcão, e já tinha aprendido a fazer aqueles
drinks da hora e cheio de fluflu. Vai ela lá, parecia fazer isso a me provocar,
tinha outros por lá, e só pedia a bebida pra mim. No final da tarde, aí quando
ela paga o que consumiu e das amiguinhas, que deu quase uns R$ 50,00, me deu
uma nota de 50 e outra de 10 e me fala, ah pode ficar com o troco de gorjeta.









Putzs eu não acreditava nisso, a
burguesinha me deixou uma gorjeta de R$ 10,00, eu não sei se achei pouco pra
quem tinha muita grana, ou uma sacanagem depois de tantos olhares. Deu uma
vontade de falar algo pra ela, mas na hora só agradeci, vou dizer o que né, ali
era o meu trabalho. Entreguei os R$ 50,00 pro seu João do caixa do bar do
clube, e guardei a nota que me deu dentro do bolso, o expediente acabou e fui
pro ponto de ônibus.









Não
sou doido pra rasgar dinheiro
né, peguei e ainda usei para pagar a passagem, o ônibus lotado dei a
nota pro
cobrador e ele me pergunta se eu tinha menor porque estava sem troco
porque  a maioria passa cartão. E eu  disse pra ele que menor até tenho,
devo ter
umas moedas espalhadas na mochila se tu esperar eu cato e te dou. Catei
as
moedas e dei, e guardei a nota de novo no bolso.









Voltando pra casa, tomei aquela chuveirada, e tentei dormir mas o churrasco na laje estava comendo solto, o
funk tremia, mas eu nem sei se não dormia por causa disso ou por causa daquela
mina. Ah tá tranquilo, tá favorável! Está difícil de dormir mas vou tentar descansar a carcaça porque eu mereço.









Uns dias depois fui chamado pra
uma entrevista e passei, larguei a vida de buffet, era melhor um emprego de
carteira assinada, e dinheiro certo do que um talvez. A única coisa ruim era
que eu não ia mais ver a Alice, somos de mundos diferentes, mas sei lá a
esperança é a última que morre. Vai que um dia a gente se esbarra por aí, mesmo ela sendo do país das Maravilhas.









No
final de semana, estou eu lá separando as roupas
pra lavar, pego aquela roupa de garçom, e me bateu aquela saudade, claro
que não foi de servir os outros né. Quando vou mexer no bolso a tal
nota de R$ 10,00 toda
amassada, vou desdobrar e o que vejo quase mudei de cor, eu não sei como
não vi
antes isso, estava escrito com uma letra pequenininha bem assim: Quero
conhecer
seu mundo! Alice e um número de telefone. Putzs! “Hoje, é hoje, é hoje, é
hoje!!!” Liguei e marcamos de sair à noite, aliás marcamos dela vir até
mim,  ela queria ir no baile aqui da favela.









Dá licença gente! Já deu minha
hora, estou descendo a ladeira, pra buscar minha burguesinha, como a esperança
é a última que morre, lá vai o Pretin todo cheirosin, vem Alice que hoje eu to
facim
, facim.




















Ciana Andrade 
























[Dia 19 de Abril] -
WEDA 2016


Inspirado na música " Burguesinha" de Seu Jorge







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34 Comentários

  1. Hahahaha A-D-O-R-E-I!!!
    E não é que o pretin se deu bem??? Ficou muito legal mesmo! Talvez um pouco previsível... mas e daí, né? Tá ótimo e pronto! hahahaha
    E pra quem não escrevia contos... tá te saindo bem pra caramba!

    Um beijo.

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    1. rsrs tb achei previsível, isso é muito comum no Rio de Janeiro. Muitas garotas saem dos seus mundos e vão para os bailes de funk em casas noturnas. Mas não tinha como não imaginar outro final para o Pretin rsrs. Comecei com um poema mas larguei e quis escrever esse conto, adoro ver gente humilde se dando bem.kkk
      É nóis! Sou carioca e suburbana com orgulho!
      bjs

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  2. Nosssssssssssssa que delícia. Que tradução dos fatos, um misto de realidade com a fantasia. Um conto típico de seu Jorge. Parabéns Luzinha.

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  3. Achei super legal o seu texto! Me fez entrar um pouco num mundo a qual não estou acostumada :)
    Parabéns ❤️
    Beijos.

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  4. Gente, fiquei esperando o final da história com um felizes para sempre ahahha a romântica né? ahahhaha cara, quando eu tava lendo, juro que eu olhei umas três vezes para ver o seu nome, porque achei que fosse algum colaborador, mas mesmo assim me intrigou completamente! eu achei a história super boa! cliché ou previsível pouco importa, você conseguiu me prender do inicio ao fim, tipo quero um filme com essa história, e já fico imaginando quem será os atores ahahahhahahhaha adoro imaginar histórias assim ahahahha :D

    muito bom!
    beijos :*
    http://japona.mairanmaba.com

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    1. A vida é clichê Maíra, quando se trata de amor dificilmente na vida real será diferente, eu poderia ter dado um outro rumo ao conto, mas essa é a realidade do subúrbio carioca, das comunidades, enfim das favelas. Isso acontece e muito, só retratei de maneira fiel o que realmente acontece, é previsível porque é assim mesmo que acontece. Obrigada! bjs

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  5. Como todas disseram: PREVISIVEL hahahahahahah
    Adorei, parabens pelo post. Misto de ficcao e realidade haha❤️ Bjs bjs

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    1. Sim previsível, sou carioca, suburbana, todas as expressões usadas, as chamadas gírias são usadas no meu Estado. Eu não tinha como dar outro rumo ao conto porque é assim a realidade carioca, eu quis retratar o que realmente acontece. bj

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  6. Também sou carioca então me diverti rsrs! Amo seu blog, bjs!

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  7. Confesso que esse foi um dos textos mais legais que li ultimamente, gostei muito da linguagem que você usou.

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    1. Que bom Larissa! O texto é leve, jovial e usa a linguagem carioca, como a maioria falou é previsível,mas é assim que acontece mesmo. bjs

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  8. Ahhh, adoreeei a brincadeira que fez com a músicaaa rs. Ficou demais, sério. E a história super envolvente. Parabéns pelo talento rs. Consegui imaginar cada coisinha ♥

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    1. Obrigada Kelly! Acho que essa parte da música casou bem com o texto.rsrs

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  9. Engraçado porque geralmente a gente imagina que eles vão se reencontrar e tudo mais, mas eu não, tava achando que tinha acabado mesmo, então fiquei até surpresa com o final, hahaha! Adorei!
    http://sweetluly.expressorosa.com/

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    1. Poxa que bom porque você viu que a maioria já dava certo o final.rsrs Nunca gostei de interpretação de texto na escola porque nunca concordava.rsrs Acho que cada um pode ter uma percepção do assunto.
      bjs

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  10. Demais! Incrível a ideia de se inspirar em músicas. Conheço muita gente que tem preconceito com a negra e o branco juntos, até em séries de televisão, dá pra acreditar? Em que século a gente vive? kkkk
    Você escreve muito bem! Com carinho, Menina Borboleta

    http://meniborboleta.blogspot.com.br/

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    1. Obrigada sua linda. Realmente ainda existe esse preconceito, sobretudo também em relação a classe social.bjs

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  11. Adorei a ideia de escrever baseando-se numa música! Gostei muito da história e da sua escrita, deu pra "entrar" mesmo nessa realidade, no jeito de falar e tal. Eu confesso que vi os comentários falando sobre ser previsível, mas nem imaginei como eles iam se encontrar, com o recado na nota. Sou meio devagar mesmo! hahaha

    Beijos!

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    1. rsrs é mas você que se engana, prestou mais atenção no texto, nos pequenos detalhes. A vida, o amor é clichê e essa é a realidade acontece mesmo. bjs

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  12. Olá Ciana, tudo bem?
    Fiquei presa ao seu texto do início ao fim. Imaginei como seria a cena do encontro entre os dois na minha cabeça e pareceu algo muito bacana. ♥
    Achei seu texto muito bem escrito. Além disso, se inspirar em uma música para escrevê-lo é bastante criativo.
    Beijos :*

    www.midnight-skies.com

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  13. Hahahaha achei muito divertido também! E achei tudo a ver com a música também :D
    boa semana :)

    Red Behavior

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  14. Que historia legal haha Eu fiquei super entusiasmada com cada palavra, cada frase, cada paragrafo, sua historia me prendeu totalmente! E esse final, eu não esperava por isso haha Muito bom, de verdade! Ahh, eu também gosto de escrever textos baseados, ou escutando músicas <3
    Beijão

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    1. Obrigada Sara! Eu não tenho costume de escrever textos baseados ou escutando música, na verdade escrevo muito sobre imagens, é que esse texto foi um desafio do grupo a qual pertenço. Fico feliz que gostou. bj

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  15. Meninaa, parabéns viu! Porque olha, escrever já é algo difícil imagina então baseado em uma música que nem foi você que escolheu...eu jamais conseguiria. Você tem talento girl!


    Relíquias da Lara

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  16. Menina! Que texto maravilhoso é esse? Imaginei ser inspirado na música da banda Oriente, me enganei super hahahah!
    Beijos,
    www.hitsdomomento.com

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    1. Não conheço essa banda Clara, vou procurar depois. Obrigada! bjs

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  17. Olá, Ciana!
    Que texto maravilhoso :D Me diverti muito encanto lia hahahaha Imaginei toda uma cena na cabeça haha Arrasou!
    Beijos, Garota Vermelha
    www.livrosdagarotavermelha.com.br

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